sexta-feira, março 13, 2009

A alegria é como um rio: corre incessantemente...

(Chagall)
Até ali, todos os meus personagens eram reais, extraídos da vida, a minha própria vida. Augusto é único, na medida em que me veio do azul. Mas o que é o azul que nos cerca e envolve se não a própria realidade?
Verdadeiramente, nós não inventamos o que quer que seja. Pedimos emprestado e recriamos. Destapamos e descobrimos. Tudo foi dado, como dizem os místicos. Para nos identificarmos com tudo o que está, mais não temos que abrir os olhos e o coração.
Embora nem sempre o tenha sabido, o palhaço exerce em mim uma atracção profunda, justamente porque está separado do mundo pelo riso. O seu riso nada tem de Homérico, é um riso silencioso, o que nós chamamos um riso sem alegria. O palhaço ensina-nos a rir de nós próprios. E esse nosso riso nasce das lágrimas.
A alegria é como um rio: corre incessantemente. Parece-me ser esta a mensagem que o palhaço procura transmitir-nos: deveríamos participar no fluxo e movimento contínuos, não pararmos para reflectir, comparar, analisar, dominar, mas continuarmos a fluir, sempre e sempre como a
música. Tal é o dom da renúncia, que o palhaço realiza simbolicamente. A nós nos compete torná-lo real. (cont.)

(Henry Miller)

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