-Queres ler o que está escrito por cima da partitura? perguntou a senhora.
-Moderato Cantabile-disse a criança.
A senhora marcou esta resposta com uma pancada do lápis no teclado. A criança ficou imóvel, a cabeça voltada para a partitura.
-E o que quer dizer moderato cantabile?
-Não sei.
Uma mulher, sentada a três metros dali, suspirou.
-Tens a certeza de não saber o que quer dizer moderato cantabile?-retomou a senhora.
A criança não respondeu. A senhora deu um grito de sufocada impotência, batendo de novo com o lápis sobre o teclado. A criança não mexeu nem uma pestana. A senhora voltou-se.
-Senhora Desbaresdes, que teimoso que aqui tem-disse ela.
Anne Desbaresdes suspirou novamente.
- A quem o diz- observou ela.
A criança, imóvel, olhos baixos, foi o único a lembrar-se que a noite acabava de romper. Estremeceu.
-Disse-te da última vez, disse-te da penúltima vez, disse-te cem vezes, tens a certeza de não saber?
A criança achou melhor não responder. A senhora reconsiderou novamente o objecto que estava na sua frente. A sua fúria aumentou.
- Vai recomeçar-disse muito baixo Anne Desbaresdes.
O que se passa- continuou a senhora-, o que se passa é que tu não queres dizer.
Anne Desbaresdes reconsiderou também a criança dos pés à cabeça, mas de forma diferente da senhora.
-Vais dizê-lo imediatamente- vociferou a senhora.
A criança não demonstrou qualquer surpresa.
Continuou sem responder. Então a senhora bateu pela terceira vez no teclado, mas com tanta força que o lápis se partiu. Mesmo ao lado das mão da criança. Estas haviam apenas despontado, eram redondas, leitosas ainda. Fechadas sobre si próprias, não se mexeram.
-É uma criança difícil- ousou dize Anne Desbaresdes, não sem uma certa timidez.
A criança virou a cabeça para esta voz, para ela, depressa, o tempo de se assegurar da sua existência, depois retomou a sua pose de objecto diante da partitura. As mãos continuaram fechadas.
-Não quero saber se ele é difícil ou não, Senhora Desbaresdes-disse a senhora. Difícil ou não, senhora Desbaresdes-disse a senhora- Difícil ou não , ele tem de obedecer.
(Marguerite Duras -Moderato Cantabile)
-Moderato Cantabile-disse a criança.
A senhora marcou esta resposta com uma pancada do lápis no teclado. A criança ficou imóvel, a cabeça voltada para a partitura.
-E o que quer dizer moderato cantabile?
-Não sei.
Uma mulher, sentada a três metros dali, suspirou.
-Tens a certeza de não saber o que quer dizer moderato cantabile?-retomou a senhora.
A criança não respondeu. A senhora deu um grito de sufocada impotência, batendo de novo com o lápis sobre o teclado. A criança não mexeu nem uma pestana. A senhora voltou-se.
-Senhora Desbaresdes, que teimoso que aqui tem-disse ela.
Anne Desbaresdes suspirou novamente.
- A quem o diz- observou ela.
A criança, imóvel, olhos baixos, foi o único a lembrar-se que a noite acabava de romper. Estremeceu.
-Disse-te da última vez, disse-te da penúltima vez, disse-te cem vezes, tens a certeza de não saber?
A criança achou melhor não responder. A senhora reconsiderou novamente o objecto que estava na sua frente. A sua fúria aumentou.
- Vai recomeçar-disse muito baixo Anne Desbaresdes.
O que se passa- continuou a senhora-, o que se passa é que tu não queres dizer.
Anne Desbaresdes reconsiderou também a criança dos pés à cabeça, mas de forma diferente da senhora.
-Vais dizê-lo imediatamente- vociferou a senhora.
A criança não demonstrou qualquer surpresa.
Continuou sem responder. Então a senhora bateu pela terceira vez no teclado, mas com tanta força que o lápis se partiu. Mesmo ao lado das mão da criança. Estas haviam apenas despontado, eram redondas, leitosas ainda. Fechadas sobre si próprias, não se mexeram.
-É uma criança difícil- ousou dize Anne Desbaresdes, não sem uma certa timidez.
A criança virou a cabeça para esta voz, para ela, depressa, o tempo de se assegurar da sua existência, depois retomou a sua pose de objecto diante da partitura. As mãos continuaram fechadas.
-Não quero saber se ele é difícil ou não, Senhora Desbaresdes-disse a senhora. Difícil ou não, senhora Desbaresdes-disse a senhora- Difícil ou não , ele tem de obedecer.
(Marguerite Duras -Moderato Cantabile)
Para além de muito pai, muito professor lucraria bastante em ler, mas sobretudo compreender, este excerto.
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