Acordei e, sem consultar o céu, pedi um carro para aquele dia. Lembrei-me de duas coisas quando parti na sumptuosa limusina: uma, não me esquecer de perguntar por Kyrios Alexandros em Faistos; outra, observar se, como consta que Monsieur Herriot disse quando subiu ao recinto do palácio, o céu está de facto mais perto da terra do que em qualquer outro lugar deste globo.
Metemos pelo portão em ruínas numa nuvem de poeira, pondo em fuga galinhas, cães, gatos,perus, crianças nuas e encanecidos vendedores de doces à esquerda e à direita; irrompemos a toda a velocidade no terreno castanho e pardacento de gutapercha que se fecha sobre a cidade como argamassa a tapar uma enorme fenda. Não havia lobos, abutras ou répteis venenosos à vista. Havia um sol inundado de tons de limão e laranja que parava ominosamente sobre a terra esbraseada com aquele espantoso resplendor alastrante que inebriava Van Gogh. Passámos imperceptivelmente das movediças terras más para uma fértil região ondulada, salpicada de campos de culturas de cores vivas, que me recordou o sereno e firme sorriso que o nosso Sul nos dá quando viajamos pelo estado de Virgínia. Deixou-me a sonhar, a sonhar com a meiguice e a docilidade da terra quando o homem a acaricia com mãos extremosas .(...) Começámos a subir, contornando arestas de descidas alcantiladas, atravessando as ravinas que a terra ergue como os joelhos de um gigante cobertos de bombazina. Aqui e ali, um homem, uma mulher, o semeador, a ceifeira, recortados em silhueta contra nuvens encapeladas de espuma de sabão. Subimos para além das terras cultivadas, contorcendo-nos para trás e para a frente como uma cobra, ascendendo às alturas da contemplação, à morada da sálvia, da águia, da nuvem borrascosa. Enormes, desvairadas colunas de pedra, riscadas por cicatrizes feitas pelo vento e pelos raios, agrisalhadas na cor do susto, tremendo, mais altas em cima do que em baixo, equilibradas como como demónios macrocósmicos, confina a estrada.(cont.)
Metemos pelo portão em ruínas numa nuvem de poeira, pondo em fuga galinhas, cães, gatos,perus, crianças nuas e encanecidos vendedores de doces à esquerda e à direita; irrompemos a toda a velocidade no terreno castanho e pardacento de gutapercha que se fecha sobre a cidade como argamassa a tapar uma enorme fenda. Não havia lobos, abutras ou répteis venenosos à vista. Havia um sol inundado de tons de limão e laranja que parava ominosamente sobre a terra esbraseada com aquele espantoso resplendor alastrante que inebriava Van Gogh. Passámos imperceptivelmente das movediças terras más para uma fértil região ondulada, salpicada de campos de culturas de cores vivas, que me recordou o sereno e firme sorriso que o nosso Sul nos dá quando viajamos pelo estado de Virgínia. Deixou-me a sonhar, a sonhar com a meiguice e a docilidade da terra quando o homem a acaricia com mãos extremosas .(...) Começámos a subir, contornando arestas de descidas alcantiladas, atravessando as ravinas que a terra ergue como os joelhos de um gigante cobertos de bombazina. Aqui e ali, um homem, uma mulher, o semeador, a ceifeira, recortados em silhueta contra nuvens encapeladas de espuma de sabão. Subimos para além das terras cultivadas, contorcendo-nos para trás e para a frente como uma cobra, ascendendo às alturas da contemplação, à morada da sálvia, da águia, da nuvem borrascosa. Enormes, desvairadas colunas de pedra, riscadas por cicatrizes feitas pelo vento e pelos raios, agrisalhadas na cor do susto, tremendo, mais altas em cima do que em baixo, equilibradas como como demónios macrocósmicos, confina a estrada.(cont.)
(Henry Miller- O Colosso de Maroussi)
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