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20.
- Será que o cão tem espírito?, perguntou-me o filho do meio.
Olhei para ele surpreendido.E acabei por responder:
- Não sei sequer se nós próprios temos espírito ou se é o espírito que nos
tem ou está em nós.
- é isso o que eu queria dizer. Olha para ele.
Era um fim de tarde de Agosto, o cão estava parado frente ao mar, o pêlo muito luzidio, a cabeça levantada, narinas abertas, sorvendo o ar.
- Ele está a cheirar o espírito. O espírito da terra, o espírito do vento, o espírito das águas.
24.
Mais tarde, na praia, sempre que nos lançámos à água ele ficava agitado. Mas mantinha-se em terra enquanto a minha mulher lá estivesse. Assim que ela vinha nadar connnosco, logo ele se lançava à água, passava-lhe à frente e procurava empurrá-la para a praia. Por mais esforços que fizéssemos para ele a deixar em paz, ele não desistia. Nós podíamos ir pelo mar a dentro, a dona não. Não queria perder a mãe outra vez.
27.
( Podes correr comigo pela praia fora, aqui ninguém nos vê, somos só nós e o mar, saltas a meu lado como se fosses um pedaço de areia e vento, uma estátua movente, cão de água, anda daí comigo por esta noite dentro.)
Manuel Alegre ( Cão como Nós)
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