segunda-feira, outubro 19, 2009

O reflexo da luz é um «íman suave»


Entre no primeiro mundo de Joey e recorde o que nunca chegou a esquecer. Imagine que nenhuma
das coisas que vê, ou toca, ou ouve, tem nome ou uma função, e que poucas delas lhe despertam alguma recordação. Joey trava conhecimento com objectos e situações principalmente por causa dos sentimentos que eles lhe evocam. Não os conhece como objectos em si mesmos, nem pelo que eles fazem nem pelos seus nomes. Quando os pais lhe chamam « querido» ele não sabe que se trata de uma palavra e que se refere à sua pessoa. Nem sequer a reconhece como um som, diferente de um toque ou de uma luz. Mas repara, com cuidado, no modo como este som o atinge. Sente-o percorrê-lo, macio e suave, acalmando-o; tal como sente a aspereza, a turbulência, de um som que o agita, despertando a sua atenção. Todas as experiências são assim, têm um tom especial em que são sentidas-tanto pelas crianças como pelos adultos. Só que nós não lhe prestamos tanta atenção. A nossa percepção da existência não está centrada nele, como a de Joey.(...)

Um Reflexo de Sol: 7 h 5m
Joey acabou de acordar. Fica a olhar para um reflexo de sol, na parede ao lado  do berço.

Um espaço brilha ali,
Um íman suave atrai para cativar.
O espaço torna-se mais quente e ganha vida.
Dentro dele, as forças começam a andar em volta umas das outras, numa dança lenta.
A dança está cada vez mais perto.
Tudo se levanta para ir ter com ela.
Continua a avançar. Mas nunca chega.
A excitação passa.
Para Joey, a maior parte dos contactos com o mundo são dramáticos e emocionais- um drama cujos elementos e cuja natureza não são evidentes para nós, adultos. De todas as coisas que existem no quarto, só o reflexo de sol atrai e prende a atenção de Joey. O seu brilho e a sua intensidade são irresistíveis. Com seis semanas, Joey vê bastante bem, embora ainda não veja com perfeição. Já tem consciência das diferentes cores, formas e intensidades. E nasceu já com as suas preferências, sabe para onde quer olhar, o que lhe agrada. No topo da lista de preferências está a intensidade. É o elemento mais importante nesta cena. O sistema nervoso dos bebés está preparado para avaliar, de imediato, a intensidade de uma luz, um som, um toque- tudo o que seja acessível a qualquer um dos seus sentidos. A intensidade com que sente é, talvez, o principal dado de que dispõe para decidir se quer aproximar-se ou afastar-se de alguma coisa. A intensidade pode levá-lo a tentar proteger-se. Pode orientar tanto a sua atenção como a sua curiosidade e determinar o seu nível interno de percepção. Se uma coisa for pouco intensa ( como uma lâmpada acesa, durante o dia), a atracção que ela exerce sobre ele é fraca. Se for demasiado intensa ( como a luz do sol), ele evita-a.Mas se for moderadamente intensa, como o reflexo de luz, ele fica fascinado. Essa intensidade tolerável desperta-o. Reage a ela, alterando-se de imediato. A sua atenção aumenta. O reflexo da luz é um «íman suave» e ele sente a sua força.

(Daniel N. Stern- Diário de um bebé. O que o seu filho sente, imagina, deseja.)

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