Turner na liberdade das suas aguarelas dá-nos a emoção do olhar e do sentir em estado puro.Este espaço propõe-se convocar, pela voz dos que sabem, múltiplos instantes de vida: luz e sombra; esquecimento e memória; vida e morte...
"Seja qual fôr o caminho que eu escolher um poeta já passou por ele antes de mim"
S. Freud
segunda-feira, junho 30, 2008
Portas, imensas e nocturnas portas...
Nocturnas Portas
Portas, imensas e nocturnas portas, quando o que desejamos é um rasgão luminoso.
(Mário Rui de Oliveira- O vento da Noite)
domingo, junho 29, 2008
o homem é, metafísicamente falando, uma laranja
- Não? (cont.)
(Machado de Assis- O espelho, esboço de uma nova teoria da alma humana)
sábado, junho 28, 2008
REFLEXOS DO OLHAR-desafio
À beira d0 intervalo trazido pelas férias grandes, resolvi arriscar esse desafio propondo aos meus amigos visitantes a escrita do que lhes aprouver, a partir de uma foto (ou mais) que queiram usar como ponto de partida. Para isso, basta irem ao Reflexos, e escolherem o que lhes der mais jeito. Depois, é só enviarem para o mail do Blog- 2101@portugalmail.pt.
Se não antes, a partir de Setembro, o que for produzido irá ser publicado. Naturalmente os textos deverão vir identificados, no mínimo, com um nick-name e indicar a fotografia donde partiram.
Mercedes de Sosa - Simples cosas
sexta-feira, junho 27, 2008
Porquê quatro ou cinco?
Por que quatro ou cinco? Rigorosamente eram quatro os que falavam; mas, além deles, havia na sala um quinto personagem, calado, pensando, cochilando, cuja espórtula no debate não passava de um ou outro resmungo de aprovação. Esse homem tinha a mesma idade dos companheiros, entre quarenta e cinquenta anos, era provinciano, capitalista, inteligente, não sem instrução, e. ao que parece, astuto e cáustico. Não discutia nunca; e defendia-se da abstenção com um paradoxo, dizendo que a discussão era a forma polida do instinto batalhador, que jaz no homem, como uma herança bestial; e acrescentava que os serafins e os querebins não controvertiam nada, e, aliás, eram a perfeição espiritual e eterna. Como desse esta mesma resposta naquela noite, contestou-a um dos presentes, e desafiou-o a demonstrar o que dizia, se era capaz. Jacobina (assim se chamava ele) refletiu um instante e respondeu:
- Pensando bem, talvez o senhor tenha razão.
Vai senão quando, no meio da noite, sucedeu que este casmurro usou da palavra, e não dois ou três minutos, mas trinta ou quarenta. A conversa, em seus meandros, veio caír na natureza da alma, ponto que dividiu radicalmente os quatro amigos. Cada cabeça, cada sentença; não só o acordo, mas a mesma discussão, tornou-se difícil, senão impossível, pela multiplicidade de questões que se deduziram do tronco principal, e um pouco, talvez, pela inconsistência dos pareceres. Um dos argumentadores, pediu a Jacobina alguma opinião, -uma conjectura, ao menos.
- Nem conjectura, nem opinião, redarguiu ele; uma ou outra pode dar lugar a dissentimento, e, como sabem, eu não discuto. Mas, se querem ouvir-me calados, posso contar-lhes um caso da minha vida, em que ressalta a mais clara demonstração acerca da matéria de que se trata. Em primeiro lugar, não há uma só alma, há duas...
-Duas? (cont.)
(Machado de Assis-O Espelho.Esboço de uma nova teoria da alma humana)
quinta-feira, junho 26, 2008
Mesa dos Sonhos
Ao lado do homem vou crescendo
Defendo-me da morte quando dou
Meu corpo ao seu desejo violento
E lhe devoro o corpo lentamente
Mesa dos sonhos no meu corpo vivem
Todas as formas e começam
Todas as vidas
Ao lado do homem vou crescendo
E defendo-me da morte povoando
De novos sonhos a vida.
(Alexandre O'Neill- No Reino da Dinamarca)
quarta-feira, junho 25, 2008
Marisa Monte- A Lenda das Sereias
terça-feira, junho 24, 2008
Que quer a alma?
Que quer o anjo? Chamá-la.
Que quer a alma? perder-se.
Perder-se em rudes guianas
para jamais encontrar-se.
Que quer a voz? encantá-lo.
Que quer o ouvido? embeber-se
de gritos blasfematórios
até quedar aturdido.
Que quer a nuvem? raptá-lo.
Que quer o corpo? solver-se,
delir memória de vida
e quanto seja memória.
Que quer a paixão? detê-lo.
Que quer o peito? fechar-se
contra os poderes do mundo
para na treva fundir-se.
Que quer a canção? erguer-se
em arco sobre os abismos.
Que quer o homem? salvar-se,
ao prémio de uma canção.
(Carlos Drummond de Andrade-Tentativa de Exploração e de Interpretação do Estar-no-Mundo)
segunda-feira, junho 23, 2008
ALEXANDRA- Alexander Sokurov
http://timeout.sapo.pt/film.asp?f=6436
domingo, junho 22, 2008
Algures dentro de nós há outro espaço...
Dai-nos de novo o Astrolábio e o Quadrante
velas ao vento venha a partida
há sempre um Bojador perto e distante
nosso destino é navegar para diante
dobrar o Cabo dobrar a vida.
Dai-nos de novo a rosa e o compasso
a carta a bússola o roteiro a esfera
algures dentro de nós há outro espaço
chegaremos ainda a outro lado
lá onde se espera
o inesperado.
(Manuel Alegre-editado pela Galeria 111, com seis gravuras de David de Almeida)
sábado, junho 21, 2008
...e à volta entreteci um pouco de musgo
Vi uma azinheira que crescia na Louisiana
Vi uma azinheira que crescia na Louisiana,
Aí estava só, e o musgo pendia dos seus ramos,
Aí crescia, sem um companheiro, e oferecia alegres folhas verde-escuro,
E o seu aspecto rude, inflexível, robusto, fez-me pensar em mim,
Mas admirei-me que fosse capaz de dar folhas como essas, tão só que
estava, sem um amigo junto a si: eu sabia que não podia fazer o
mesmo,
Arranquei um pequeno ramo com algumas folhas e à volta entreteci um
pouco de musgo,
E levei-o e coloquei-o bem à vista no meu quarto,
Não preciso dele para lembrar-me os amigos queridos,
(Pois sei que ultimamente quase só penso neles,)
Mas é para mim um símbolo curioso, faz-me pensar no amor viril;
Apesar disso, e embora a azinheira resplandeça na Louisiana, solitária na
grande planície,
Oferecendo sempre alegres folhas, longe de um amigo ou de um amante,
Eu sei muito bem que não podia fazer o mesmo.
(Walt Whitman-Cálamo-trad de José Agostinho Baptista)
sexta-feira, junho 20, 2008
Brel-Voir un ami pleurer
quarta-feira, junho 18, 2008
Nos 120 Anos do nascimento de Pessoa-III
Programa da T.V Globo comemorativo dos 120 anos do nascimento de Fernando Pessoa
terça-feira, junho 17, 2008
A encosta do prado era tão a pique...
Revejo sobretudo plantas e animais, em plano secundário brinquedos, jogos e ritos que aconteciam à minha volta, mais vagamente e como que em último plano as pessoas. Trepo por entre ervas altas a encosta abrupta que leva ao terraço do Mont-Noir. Ainda não foi a ceifa. Há uma grande quantidade de acianos, papoilas e malmequeres, que lembram às minhas criadas a bandeira tricolor, ideia de que não gosto, porque queria que as minhas flores fossem só flores. Ignorávamos, claro, que dentro de cinco ou seis anos estas «papoilas dos Montes da Flandres» iriam ficar célebres por um motivo fúnebre, dormideiras em verdade, sagradas para o sono de alguns milhares de jovens ingleses que ali foram mortos, e de que ainda se vendem no nosso tempo reproduções em papel de seda escarlate para certas obras de caridade anglo-saxónicas. A encosta do prado era tão a pique que o carrinho de mão que eu puxava, cheio de ameixas ou de groselhas verdes colhidas no pomar entornavam-se sempre e elas rebolavam pela erva. No tempo das tílias em flor, a colheita durava vários dias. Estendíamo-la depois no chão do celeiro que cheirava bem todo o Verão.
Tive uma cabra branca a que o próprio Michel dourou os chifres, animal mitológico antes de eu saber o que era a Mitologia. Tive um grande carneiro muito branco a que dávamos banho todos os sábados na cuba da lavandaria; fugia para se rebolar na erva húmida, perseguido, quando era a grande barrela da Primavera em que se estendiam no campo os lençóis, as fronhas, as toalhas e os guardanapos amontoados no celeiro desde o último Outono, pelas lavadeiras aflitas e aos gritos.(...) Na altura dos belos crepúsculos, Michel acendia nos bosques inúmeras lamparinas esverdeadas parecidas com pirilampos; a criança que segurava aquela mão forte poderia pensar que tinha entrado no reino das fadas. Ficava um pouco inquieta por se perturbar o sono dos coelhos, mas garantiam-lhe que os coelhos já estavam a dormir nas tocas.
(Marguerite Yourcenar- O quê? A Eternidade)
segunda-feira, junho 16, 2008
Leôncio e Lena -Teatro da Cornucópia
Tradução Renato Correia
Encenação
Cenário Joana Villaverde
Desenho de Luz José
Interpretação David Almeida, David Pereira Bastos, Luis Miguel Cintra,
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domingo, junho 15, 2008
De Sábado para Domingo...um filme- O Paciente Inglês
sábado, junho 14, 2008
Agostinho da Silva, a instrução, a educação...e...Fernando Pessoa
sexta-feira, junho 13, 2008
O manjerico e a bandeira...
O vaso do manjerico
Caiu da janela abaixo.
Vai buscá-lo, que aqui fico
A ver se sem ti te acho
O vaso que dei àquela
Que não sabe quem lh'o deu
Há-de ser posto à janela
Sem ninguém saber que é meu
No dia de Santo António
Todos riem sem razão
Em S.João e S.Pedro
Como é que todos rirão?
O manjerico e a bandeira
Que há no cravo de papel-
Tudo isso enche a noite inteira,
Ó boca de carne e mel.
(Fernando Pessoa- Quadras)
Têm dois ofícios...
Ninguém haverá( se tem entendimento) que não deseje saber por que ajuntou a Natureza no mesmo instrumento as lágrimas e a vista;e por que uniu na mesma potência o ofício de chorar, e o de ver? O ver é a acção mais alegre; o chorar a mais triste. Sem ver, como dizia Tobias, não há gosto, porque o sabor de todos os gostos é o ver; pelo contrário, o chorar é o estilado da dor, o sangue da alma, a tinta do coração, o fel da vida, o líquido do sentimento. Por que ajuntou logo a natureza nos mesmos olhos dois efeitos tão contrários, ver e chorar? A razão e a experiência é esta. Ajuntou a natureza a vista e as lágrimas, poque as lágrimas são a consequência da vista; ajuntou a Providência o chorar com o ver, porque o ver é a causa do chorar. Sabeis porque choram os olhos? Porque vêem.
(Padre António Vieira)
quarta-feira, junho 11, 2008
Nos 120 anos do nascimento de Pessoa-II
2ºprograma da T.V Globo comemorativo dos 120 anos do nascimento de Pessoa
terça-feira, junho 10, 2008
Com o tempo...
Com o Tempo o Prado Seco Reverdece
Com o tempo o prado seco reverdece,
Com o tempo cai a folha ao bosque umbroso,
Com o tempo para o rio caudaloso,
Com o tempo o campo pobre se enriquece,
Com o tempo um louro morre, outro floresce,
Com o tempo um é sereno, outro invernoso,
Com o tempo foge o mal duro e penoso,
Com o tempo torna o bem já quando esquece,
Com o tempo faz mudança a sorte avara,
Com o tempo se aniquila um grande estado,
Com o tempo torna a ser mais eminente.
Com o tempo tudo anda, e tudo pára,
Mas só aquele tempo que é passado
Com o tempo se não faz tempo presente.
(atribuído a Luís Vaz de Camões)
segunda-feira, junho 09, 2008
A Flor
A Flor
Entre a erva dos nervos camuflada,
emboscada no túnel de uma veia,
a flor apenas rompe, deslumbrada,
quando o pinhal à noite se incendeia...
Virá a converter-se em depressão,
enfarte do miocárdio, ou embolia,
no dia em que se apague esse clarão
com que a sua presença se anuncia...?
Mas numa artéria já sem movimento,
ou na erva dos nervos recolhida,
descobrirão a flor feita de vento
que em vida me deu morte e me deu vida...
Hão-de enterrar então a flor e o vaso.
E nunca ninguém mais alude ao caso.
(David Mourão-Ferreira- Infinito Pessoal)
domingo, junho 08, 2008
Celebrar Velásquez, dois dias depois...
http://pt.wikipedia.org/wiki/Diego_Vel%C3%A1zquez
sábado, junho 07, 2008
Nos 120 Anos do nascimento de Fernando Pessoa
sexta-feira, junho 06, 2008
Oiçam comigo:Maria Bethânia com Fernando Pessoa
quinta-feira, junho 05, 2008
Que melhor pertexto?
É tão frágil a vida
O melhor pretexto
É tão frágil a vida
tão efémero tudo!
(não é verdade, amiga,
Olhinhos-cor-de –musgo?)
E ao mesmo tempo é forte,
forte da veleidade
de resistir à morte
quanto maior a idade
Assim, aos trinta e sete,
fechados alguns ciclos,
a vida ainda pede
mais sentimento, vínculos,
Não tanto os que nos deram
a fúria de viver,
como esses descobertos
depois de se saber
que a vida não é outra
senão a que fazemos
( e a vida é una só,
pois jamais voltaremos).
Partidários da vida,
melhor: do que está vivo,
Digamos “não!” a tudo
que tenha outro sentido
E que melhor pretexto
( quem o saiba que o diga!)
teremos p’ra viver
senão a própria vida?
Alexandre O’Neill ( Poemas com endereço)
quarta-feira, junho 04, 2008
Digamos...
A VIOLETA
digamos: uma flor
um débil mundo de pétalas
aberto
digamos:uma cor
mais roxa de nossas dores escolhida
digamos: um ribeiro
um local habitável para a flor
a inventar
digamos: um perfume
impresso
na flor à beira-água
digamos: memória
diluída
no perfume da flor
por fim
digamos: uma violeta
eis a flor
(A.M.Pires Cabral- Antes que o Rio Seque)
terça-feira, junho 03, 2008
Ravel-Jogos de Água
segunda-feira, junho 02, 2008
Era a nudez da inteligência...
ADÃO e EVA
Feliz era nudez. Vinha diurna
de dentro de si mesma. Porque o dia
ressumbrava recente desde a sua
novidade de pasmo. E de pupila
apta à evidência. E, por isso, arguta,
sem deduzir-se duma argúcia activa.
Onde fossem seus passos a espessura
entregava o seu fervor de enigma
para, depois, se recolher. Ter junta
e pronta a ordem de nova epifania.
Era a nudez da inteligência. Abrupta
e, ao mesmo tempo, de precisão tão íntima
que até os recantos justos da penumbra
recrutavam a luz da perspectiva.
(Fernando Echevarría)
domingo, junho 01, 2008
"O melhor do mundo são as crianças"
Quando as crianças brincam
Eu as oiço brincar,
Qualquer coisa em minha alma
Começa a se alegrar
E toda aquela infância
Que não tive me vem,
Numa onda de alegria
Que não foi de ninguém.
[...]
(Pessoa, 1965, p.169)
Para o Simão e todos os meninos e meninas