(Hammershoi)
Mas não é igual para todos o silêncio.
Veja-se, por exemplo, o que acontece com as mulheres. Elas que têm a reputação de faladoras, sabem bem o que é calar-se, ou melhor, a eficácia do não-dito. Conhecem a vantagem tantas vezes medonha do mutismo. É no inconfessável que rescrevem a sua história, conquistando pequenos e grandes poderes.
Não é muito diferente o silêncio confuso da infância. Foi no recalcamento da palavra que nos formámos. Foi no "não chores", foi no "cala-te"que começámos a medir a extensão do nosso desamparo. E se pensarmos nos idosos, concluímos que o silêncio tem não só sexo, mas também idades preferidas. Nestes casos dá origem a subentendidos que são a expressão da solidão, quando não da dissidência.
Porque é inodoro , incolor e intocável, porque não tem princípio nem fins conhecidos, o tempo vive numa clandestinidade silenciosa que o tornaria imperceptível se não fosse o contra-poder da memória que é a utopia onde o passado e o presente se encontram. Quando dizemos: lembras-te? estamos a querer resistir ao tempo que, silente, passa. É que, na sua vertigem absoluta e muda, o tempo ignora datas. Por isso é que as efemérides são um contratempo, uma reminescência parada e espectral. É o que chamamos melancolia, território habitado por hirtos fantasmas que só pensam voltar a si rodeados por detritos. (...)É uma compensação infeliz à energia devastadora da sua passagem. É um pálido e exausto fantasma. Exausto, pálido e sonhador porque não há lembranças felizes. Todo o ontem é inconsolável mesmo que não proteste contra a falsa novidade do hoje. É como aquele professor que depois de ter passado vários anos na prisão, recomeçou as aulas assim: "Como vos tinha dito ontem..."mostrando, deste modo, simples e sofrido, que o tempo passa mas é o mesmo, unido pelos dois extremos do silêncio.
Veja-se, por exemplo, o que acontece com as mulheres. Elas que têm a reputação de faladoras, sabem bem o que é calar-se, ou melhor, a eficácia do não-dito. Conhecem a vantagem tantas vezes medonha do mutismo. É no inconfessável que rescrevem a sua história, conquistando pequenos e grandes poderes.
Não é muito diferente o silêncio confuso da infância. Foi no recalcamento da palavra que nos formámos. Foi no "não chores", foi no "cala-te"que começámos a medir a extensão do nosso desamparo. E se pensarmos nos idosos, concluímos que o silêncio tem não só sexo, mas também idades preferidas. Nestes casos dá origem a subentendidos que são a expressão da solidão, quando não da dissidência.
Porque é inodoro , incolor e intocável, porque não tem princípio nem fins conhecidos, o tempo vive numa clandestinidade silenciosa que o tornaria imperceptível se não fosse o contra-poder da memória que é a utopia onde o passado e o presente se encontram. Quando dizemos: lembras-te? estamos a querer resistir ao tempo que, silente, passa. É que, na sua vertigem absoluta e muda, o tempo ignora datas. Por isso é que as efemérides são um contratempo, uma reminescência parada e espectral. É o que chamamos melancolia, território habitado por hirtos fantasmas que só pensam voltar a si rodeados por detritos. (...)É uma compensação infeliz à energia devastadora da sua passagem. É um pálido e exausto fantasma. Exausto, pálido e sonhador porque não há lembranças felizes. Todo o ontem é inconsolável mesmo que não proteste contra a falsa novidade do hoje. É como aquele professor que depois de ter passado vários anos na prisão, recomeçou as aulas assim: "Como vos tinha dito ontem..."mostrando, deste modo, simples e sofrido, que o tempo passa mas é o mesmo, unido pelos dois extremos do silêncio.
(Fernando Gandra- O Sossego como problema( peregrinatio ad loca utopica)
o tempo passa mas é o mesmo e nós não somos outros com o seu passar. Apenas mais sofridos.
ResponderEliminarCom o silêncio se ganha e se perde.
ResponderEliminar