«Como conceber Cesário sem Lisboa? Como conceber Pascoaes sem o Marão?, perguntara O'Neill , recordando o poeta de Amarante por ocasião da sua morte. Como conceber O'Neill sem Lisboa?, acrescentaremos nós, os do séc. XXI. A nossa ideia da cidade de Lisboa da segunda metade do século XX ficará indelevelmente marcada pela poesia de Alexandre O´Neill, tal como na Lisboa de finais do século XIX perpassam os verso de Cesário Verde. O´Neill costumava ler Cesário para a Teresa, sua segunda mulher. Das influências que lhe foram apontando, Cesário era aquela que nunca desdenhava, homenageando-o várias vezes na poesia. Mas a paisagem urbana de O'Neill é determinada pela ironia, por uma postura derrisória que se debate entre o mítico e o típico da capital- a cidade onde nasceu é, na sua poesia, uma metonímia do país, e de si próprio, como ironista radical que é. A Lisboa de Alexandre O´Neill é um exercício irónico sobre o tipo alfacinha, jogo de um fascinado pela banalidade e pelo lugar-comum. (...)
Que olhar era este, que ele lançava sobre os bas-fonds da sociedade portuguesa, sobre o povo seboso e acanalhado ao qual não pertencia nem por nascimento, nem por educação?
Sobranceiro, desdenhoso, paternalista? Não me parece. O'Neill tinha um gosto genuíno onde se comia o « cozido de porco» (numa tasca imunda da Buraca para onde arrastava os amigos) e pelo povo que as frequentava, com quem convivia, sentado à mesma mesa; mas conservou sempre certo modo aristocrático e distante que se lhe notava: era, íntima e caracterialmente um chunga-chique. Estes dois extremos quase se tocavam nele-e é um oximoro, figura de estilo que parece ter determinado a sua forma mental, a que mais lhe ocorria quando olhava para o mundo: definir as coisas por oposição, por contraste, pela imagem díspar do surrealismo- aquelas « semelhanças misteriosas» que dizia Pascoaes, são previligiadamente captadas pela alma popular.
(Maria Antónia Oliveira- Alexandre O'Neill, uma biografia literária)
Que olhar era este, que ele lançava sobre os bas-fonds da sociedade portuguesa, sobre o povo seboso e acanalhado ao qual não pertencia nem por nascimento, nem por educação?
Sobranceiro, desdenhoso, paternalista? Não me parece. O'Neill tinha um gosto genuíno onde se comia o « cozido de porco» (numa tasca imunda da Buraca para onde arrastava os amigos) e pelo povo que as frequentava, com quem convivia, sentado à mesma mesa; mas conservou sempre certo modo aristocrático e distante que se lhe notava: era, íntima e caracterialmente um chunga-chique. Estes dois extremos quase se tocavam nele-e é um oximoro, figura de estilo que parece ter determinado a sua forma mental, a que mais lhe ocorria quando olhava para o mundo: definir as coisas por oposição, por contraste, pela imagem díspar do surrealismo- aquelas « semelhanças misteriosas» que dizia Pascoaes, são previligiadamente captadas pela alma popular.
(Maria Antónia Oliveira- Alexandre O'Neill, uma biografia literária)
Nestas palavras senti mesmo o O´Neill, nas suas várias facetas.
ResponderEliminarE essa "Gaivota" a esvoaçar por aqui, fica a matar...
Era humildemente superior.
ResponderEliminarO'Neill em conjunto com alguns, poucos, são os poetas da minha cidade!
ResponderEliminarO poeta da Feira cabisbaixa que somos e (raios!!)não conseguimos sair.
ResponderEliminarMas, apesar de tudo, ela, Lisboa, está-nos na pele.
Sempre muitas e boas escolhas por aqui.
ResponderEliminarbjs.
JU