quarta-feira, janeiro 10, 2007

Tudo, absolutamente, tudo foi imaginado naquela noite...

(Giotto)


Este amor louco pelo sonho, pelo prazer de sonhar, totalmente desprovido de qualquer tentativa de explicação, é uma das inclinações profundas que me aproximaram do surrealismo.(...)
Diz-se que durante o sono o cérebro protege-se do mundo exterior e que é muito menos sensível aos ruídos, aos cheiros, à luz. No entanto, por dentro parece ser bombardeado por uma autêntica tempestade de sonho que rebenta em ondas sucessivas. Milhões e milhões de imagens surgem assim cada noite, para se dissiparem no momento seguinte, envolvendo a terra num manto de sonhos perdidos. Tudo, absolutamente tudo, foi imaginado nesta ou naquela noite, por este ou por aquele cérebro e foi esquecido.
Pela parte que me toca, consegui catalogar uma quinzena de sonhos recorrentes que me seguiram ao longo da vida e têm sido fiéis companheiros de viagem. Alguns são extremamente banais: vou deliciosamente caindo num precipício, ou sou perseguido por um tigre ou touro. Dou por mim numa sala e fecho a porta atrás de mim, o touro arromba a porta, e assim sucessivamente.
Ou então, em qualquer fase da vida, vejo-me de repente peranta a obrigação de voltar a fazer exames. Pensava tê-los passado todos com sucesso, nada disso. Devo apresentar-me de novo, e claro que esqueci tudo o que devia saber.

Luis Buñuel( O meu último suspiro -Sonhos e Devaneios)