“ O paranoico projecta para os exterior as suas pulsões, atribuindo-as a um objecto, tornando-se ele a vítima dos afectos hostis que emanam agora do objecto e recaem sobre ele: o seu ego tende a diminuir ou encolher. Se extrapolarmos para o caso português, o sujeito «vive-se»
como um zero social e pessoal, um falhado, e queixa-se de tudo e todos-
queixa-se do «país» nunca de si próprio. Abre-se aqui uma esquize, uma fenda no eu, porque ele pertence e não pertence ao «país». Uma culpabilidade profunda incrusta-se em todo o seu ser: culpabilidade por ser o que é, e o que não é, por tudo e por nada, pesada e difusa ao mesmo tempo.
O resultado da acção destas duas forças contraditórias forma um extraordinário sistema de impasses que aprisiona e molda a subjectividade. O eu dilatado tende a embater contra os outros eus que
também introjectaram o mundo – o que levaria a conflitos abertos entre os indivíduos e à erosão da coesão social. Mas como a tendência contrária prevalece, o laço social tece-se em práticas de projecção do «mal», da ameaça que incide nas relações humanas,« no país». Isso mesmo reactiva perversamente o laço social : queixamo-nos do «país», queixamo-nos do «outro» a cada um dos outros reais, que fazem o mesmo. A relação real neurótica que levaria ao conflito é projectada no imaginário, a realidade( dos outros)é desrealizada ( no outro). Assim se cria um plano sonhado a que corresponde um plano prático: o queixume delirante constitui também um modo de justificar todo o pragmatismo da sobrevivência, o não-cumprimento da lei, a irresponsabilidade, o «desenrasque» a esperteza na acção.”
(José Gil- Em busca da identidade. O desnorte)
Pois é, os outros não são própriamente os "outros"...
ResponderEliminarClaro que, no fim de contas, terá que se reflectir na Economia... Talvez Portugal deitado no divã ajude mais os economistas e entender certas coisas do que muitos estudos internacionais.
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